domingo, 20 de setembro de 2009

Vinte

Este poema é uma velharia, tanto no sentido de que faz parte dos mais antigos de meus escritos, quanto no de que trata de um assunto saudosista ao extremo. Feita pouco mais de um ano após eu ter me iniciado no mundo da poesia, esta obra faz parte de Nouz Ru Nouz, o primeiro livro de poemas que de mim nasceu. E por falar em primeiro, este foi o primeiro - e também o único, até o dia de hoje - poema que escrevi sobre o meu sentimento gaúcho. E considero que terá sido também o último, pois tudo o que sinto com relação ao meu Estado - que é meu país - está contido nestes versos, mesmo que eu não seja mais um saudosista: meu atavismo farrapo grita forte dentro de minhas veias diariamente.


Saí da minha casa estranha, procurando minhas origens...
Talvez não tivesse porquê procurar,
Pois aqui dentro elas residem;
Mas me parece que o cavalo ainda troteia,
Só o guerreiro é que não monta mais:
Ele anda sem espadas, sem botas, não sei como sobrevive,
Ele tem vergonha de sua gente, não sei como isso existe...

Cheguei na estrada, mas vi que ela era de pedra:
Parece que alguém a fez, e não foi a Mãe Maior,
Parece que as novidades desvalorizaram nosso suor...
Se o homem da nossa terra precisa fazer coisas fortes,
Que vá lutar, que vá ganhar com o braço a própria sorte!

Peguei, pois, a estrada, pra ver se me levava a algum destino,
E percebi, num barulho de máquina repentino,
Que até o cavalo já não corre;
Vi uma lágrima cair na terra confusa
Por uma cultura que morre,
E enxerguei no campo o gado escapar
Pelo meio da cerca, vi o pago chorar,
Pelo meio do caminho, me vi sozinho a desabar...

Então passaram heróis em cavalaria,
E uma minoria salvou o lubuno dia...
Um facho de esperança me rebenqueou peito adentro,
E vi até gurizotes galopando ao vento!
Ao chegar na minha velha querência,
Meu olhar vago encontrou abrigo:
Dei aquele grito largo, e vinte mil gaúchos gritaram comigo!


Diorgi Giacomolli, 20 de Setembro de 2007.

domingo, 13 de setembro de 2009

Nada Pra Dizer

D or G - That is The Question é o título do livro, ou talvez um empréstimo sarcástico de Shakespeare, ou, ainda, algo que represente uma possível crise de identidade enfrentada na época. Provavelmente as três coisas, com certeza absoluta na primeira - pois de fato é o título do livro do qual vem este poema, que tem o nome que qualquer um de meus poemas poderia ter, conforme o pobre leitor - não, não colocaremos assim, pois não tenho conhecimento do interior de seu bolso -, então fica assim: (...) conforme o enfadado leitor deste blog poderá conferir [presumindo-se que vá ler todo o enfadonho conteúdo]. Ao honrado visitante deste pequeno espaço - pequeno porém imensurável, visto que é cibernético - que procura por escritos de auto-ajuda, sugiro que não me peça sugestão.


A casa cai, a notícia chega,
A mãe sem pai, o filho às cegas,
O cara da TV não me vê,
Não quer saber do que vai acontecer,
E não vai se importar
Com a notícia que acaba de dar;
Eu também, que não tenho nada pra dizer,
Venho aqui querer criticar (?!).

Meu pai, teu filho,
Eis o que há, eis o que será:
Somos figurinhas repetidas
No álbum das folhas apodrecidas
De um mundo que com sorte acabará.

Não sei mais de versos,
Gastei-os todos
Nos agostos, nos retrocessos
Da minha juventude, que não pude
Ter só pra mim.
E, se quer saber, já cansei
De tudo o que escrevi: e o que escreverei,
Podes saber, não será pra ti.

E nós aqui, subprodutos do futuro,
Sabemos que o passado não importa,
A não ser pra História e seus estudiosos,
Comunistas, sempre com as caras enfiadas na porta,
Querendo um mundo igual pra toda essa gente diferente!

Um duende verde sentou na mesa oposta
E me revelou, em tom de resposta,
Que só o que sobrou
De tudo o que se gerou nesse mundo corcunda
É a segunda, que o domingo já acabou.
E a cerveja, que não acabava nunca,
Não era a mesma, era já outra, funda,
De tanto que era o meu pensamento,
Ora, a cerveja nada tem a ver com a semana,
Que pertence ao tempo, essa insana,
Que a cerveja é como a segunda, que restou
De um domingo de amor que se findou.

Me sinto agora
Como que caminhando no Largo da Cruz,
Embora esteja tão longe,
E a pergunta - Why have you forsaken me? -
Surge de mais longe ainda.
Não sei se largo a cruz, ou se rimo
Com lago da luz,
Mas a rima não é o que importa agora,
E nem você, a quem dirijo tal pergunta -
Por que você me abandonou? -
Deixa pra lá, que a resposta também não importa mais.


Diorgi Giacomolli, 13 de Outubro de 2008. *

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Soneto Abortado

Outra do, até então, mais inspirado livro de poemas que escrevei - O Poeta Morreu, este soneto sem métrica, como são todos os meus sonetos, nasceu de um útero gélido: um falecido amor deu à luz esta obra, um destes amores que a gente mata na mudez e depois nega a existência do próprio, mentindo homericamente bem para nós mesmos que tal sentimento nunca nascera, a ponto de acreditarmos em tal calúnia que, se verdadeira fosse, abençoada seria. Mas eu não me engano: tal amor nascera, sim. Mas nascera já defunto. E - curioso! - agonizando, coisa que faz até hoje.


O amor é um útero frio
E a gente sempre nasce morto
Depois vive com o mal do pé torto
Tendo que andar no meio-fio

O amor é um útero sombrio
E a gente sempre sai de aborto
E vaga como naus longe do porto
Nadando como peixes sem rio

Por duas vezes tive o grande momento
De chorar nessa minha vida,
Uma por fora, outra por dentro...

Uma na entrada, outra na saída:
Ao sair do ventre de minha mãe querida,
E ao escapar de um amor agourento.


Diorgi Giacomolli, 19 de Abril de 2009.