quarta-feira, 22 de julho de 2009

Procurando Ouro

Retirado de Penseira, este poema guarda uma história um tanto engraçada, ao menos para mim e uma amiga. Eu estava na faculdade, era um fim de tarde, sopravam agradáveis ventos, destes que só temos na primavera, e eu estava na sala onde fazia os atendimentos da monitoria, para uma disciplina do curso de Letras. O último aluno havia acabado de sair, e eu havia passado as últimas quatro horas lecionando e pensando em escrever um poema no qual ficasse claro o lugar em que eu me encontro: "lá". Que, na verdade, é o meu aqui. Mas sinto como se os últimos trinta e dois meses houvessem passado sem que meu corpo tivesse junto de si minha alma. Minha ficou no lugar de onde meu corpo partiu. E agora meu corpo está "lá". E eu ainda não saí de onde eu quero tanto voltar.

Mas esta não é a história engraçada. Quando o último aluno saiu, e eu finalmente pude pôr no papel tudo o que tinha em mente, fiquei tão satisfeito com o que vi, que decidi recitá-lo para uma amiga. Esta cursa Biologia e, curiosamente, naquela mesma tarde, ela havia pesquisado sobre ácaros. Ei-los em meu poema:


I.
Eu fui pra lá, e lá fiquei,
naquele lugar de fazer lei
por qualquer trocado.
Mas eu não troco por nada, não nado,
não toco na desfigurada
cara do sábado onde desemboco.
Desfilo por esses bueiros
e, como em passeios faceiros,
sinto os gorjeios dos pássaros,
loucos de galanteios
pra cima dos ácaros de minha almofada.
Mas sou egoísta, não dou nada,
não peço, e confesso ao malabarista:
minha corda bamba foi arrebentada.
E aí tocou um samba,
bem na hora de ir embora,
pediram pra ficar, sorte eu não saber sambar,
azar eu estar nesse lugar...
Mas isso são outros quinhentos,
os inventos são outros, e os outros
não são a gente, que a gente
é só um bando vagando e procurando ouro.

II.
E ainda estou lá.
Decidi ficar, pensei no acolá,
mas não ia funcionar.
Fiquei lá mesmo, é o melhor lugar,
sendo que o silêncio me cegaria
e eu jamais chegaria a me consolar.
Abelhas batendo no vidro,
querendo sair, duvido que vão conseguir,
mas elas acreditam e insistem,
não se irritam nem desistem,
são capazes mesmo de atravessar.
Os cartazes dizem pra participar,
e o que fazes é ler e ignorar,
mas uma hora eu ainda chego aqui.
Já me cansei de tudo o que vi,
quero um mundo novo, conhecer outro povo,
cruzar meu nome sem me preocupar
com o sobrenome, que a essa altura
nem vai importar.
Quero uma lonjura, dessas de não enxergar,
cair de uma altura sem nem despencar,
lutar sem armadura,
na certeza de que não vão me machucar.
A beleza eu quero poder ver
sem sentir dor, nem precisar de amor, nem sofrer.
E de meu, só uma bagagem,
guardando histórias de viagem, e um violão,
pra fazer som com qualquer cidadão
que aparecer no caminho.
Não quero fazer ninho, somente bater asa,
e nada de casa! Eu não quero morar,
só quero vagar e mais vagar,
numa rapidez devagar, pois que viver não é o que faço.
É estupidez me limitar nesse espaço,
eu devia estar vivendo, e não só respirando,
só caminhando, comendo e dormindo.
Quero vagar, ir indo e mais indo,
devagar, quero conhecer o viver, sorrindo.


Diorgi Giacomolli, 24 de Outubro de 2008.

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